O Tiro Esportivo é um Esporte!
Primeiramente, gostaria de parabenizar o Departamento de Tiro
Esportivo do FFC, sob o comando da atiradora Angelamaria Lachtermacher,
pela iniciativa de criar esse site e abrir esse espaço
técnico, e ao mesmo tempo agradecer a honra do convite
para integrar esse grupo de colunistas.
Minha
missão será conduzi-los na discussão sobre
a técnica do tiro com armas curtas, ou seja, as modalidades
do tiro esportivo com pistola e revólver, tendo como foco
principal os métodos de treinamentos físicos, técnicos
e psicológicos.
Mas
antes de falar em técnica, vou roubar um pouco do espaço
do Eduardo Ferreira e falar de história do tiro.
Iniciei
minha carreira de atleta do tiro esportivo, por acaso, em 1976,
quando Aspirante na Escola Naval. Após várias tentativas
frustradas de encontrar um esporte, passando pelo tênis
de mesa, voleibol, pólo aquático e pentatlo naval,
busquei uma vaga na equipe de tiro da EN. Apesar de perseguir
o sonho de ser um grande atleta em algum esporte, espelhado em
meu pai, Iran Carvalho, que quando Cadete da AMAN e Tenente do
EB havia sido recordista das FFAA nas provas de corrida de fundo
e meio fundo (3000, 1500 e 800), a minha ida para o tiro não
estava cercada de grandes pretensões. Eu realmente buscava
apenas integrar uma equipe para usufruir das regalias que eram
concedidas aos atletas, nada mais. Na realidade, eu estava cansado
de tanto “ralar” e continuar como um atleta sem nenhuma
expressão.
Ao
me apresentar ao técnico, o Professor Silvino Fernandes
Ferreira, fui informado que havia mais oito candidatos e uma única
vaga para os, que como eu, cursava o terceiro ano. Como os integrantes
do Coral tinham as mesmas regalias dos atletas, ao saber disso
entendi que ou eu vencia a disputa pela vaga ou teria que passar
os próximos dois anos cantando. Nada contra o coral, eu
é que era muito desafinado.
Foi
uma semana de treinamento e provas seletivas, até que o
Mestre Silvino deu o seu veredicto: a vaga era minha. A forma
com que esse personagem da minha história conduziu o processo
de seleção, e a maneira carinhosa com que ele tratava
os seus alunos, foi decisiva para reativar a minha chama pela
busca de um esporte; algo me dizia que eu havia encontrado o meu
caminho.
Para
os que não sabem, Silvino é pai do Eduardo Ferreira,
do qual recebemos preciosas informações históricas,
nesse site.
As
duas razões dessa breve introdução histórica
são:
Primeiro,
homenagear aquele que foi o responsável pela minha descoberta
como atirador e pelo meu correto desenvolvimento técnico,
desde o primeiro disparo. Se não fosse o Silvino, eu teria
terminado minha passagem pela Escola Naval, como um desconhecido
componente do Coral, e não teria ido a dois Jogos Olímpicos,
Moscou (1980) e Los Angeles (1984). Graças a ele eu descobri
que o Tiro Esportivo é o meu Esporte!
Segundo,
para enfatizar a tônica dos meus futuros artigos: O Tiro
Esportivo é um Esporte! Como tal, possui fundamentos que
devem ser corretamente treinados, desde o início. Como
tal, requer treinamentos físico, técnico e psicológico,
exigindo uma equipe multidisciplinar e embasamento científico.
Sem
dúvida, a minha iniciação correta, sob a
orientação técnica do Silvino, apoiado pela
equipe multidisciplinar do Departamento de Educação
Física da EN constituiu um diferencial competitivo decisivo
para o meu sucesso como atirador.
Essa
iniciativa da TiroFlu abre um espaço importante para o
desenvolvimento técnico dos nossos atuais atiradores.
Falo
da necessidade de um acompanhamento correto e constante, por experiência
própria. Em meados de 1991, encerrei precocemente minha
carreira de atirador, em conseqüência de uma séria
contusão no ombro direito, fruto de um treinamento físico
inadequado de sustentação de peso, auto ministrado.
Retornei ao esporte em setembro de 2004, quando vendo os baixos
resultados da equipe brasileira, entendi que poderia e deveria
colaborar com o desenvolvimento dos nossos atiradores.
Desde
então, venho buscando conscientizar tanto os novos como
os mais experientes, da necessidade de adotarem um programa de
treinamento, elaborado com base nas modernas e científicas
metodologias do treinamento esportivo, ao invés de irem
ao estande simplesmente para “sedimentar erro”.
Nas
minhas palestras, inicio sempre com uma frase do guru da moderna
administração, Peter F. Drucker: “Não
há nada pior do que fazer bem feito a coisa errada”.
Fazendo um paralelo com a realidade do nosso esporte, fica claro
que a principal causa do baixo rendimento da grande maioria dos
nossos atiradores reside na prática de ir ao estande disparar,
sem um adequado programa de treinamento.
O
fato é que iniciar com um técnico competente, como
tive a sorte, é uma raridade no cenário do tiro
esportivo brasileiro. Como sou adepto a fazer parte da solução,
e não do problema, prefiro perguntar “como?”
no lugar do “por quê?”, buscando uma forma de
proporcionar aos novos as mesmas condições que tive
sob a orientação do Silvino.
Aqui
cabe uma dica aos mais experientes: se o seu resultado é
inconstante, estagnou ou está decaindo, “esvazie
a sua xícara”.
Essa
expressão vem de uma passagem muito interessante relatada
pelo mestre de artes marciais, Bruce Lee a um praticante do karatê
que lhe procurou para aperfeiçoar sua técnica. É
a respeito de um mestre Zen japonês que recebeu um professor
universitário que o procurou para informar-se sobre o Zen.
Desde o início do encontro, ficou claro para o mestre que
o professor não estava tão interessado em aprender
sobre o Zen como em impressionar o mestre com suas opiniões
e conhecimento. O mestre ouviu-o pacientemente, sugerindo ao fim
que fossem tomar chá. Ao servi-lo, o mestre encheu a xícara
do seu visitante e continuou despejando o chá. O professor
olhava a xícara derramando, até que não conseguiu
mais se conter e disse:
“A
xícara está cheia! Não cabe mais!”
“Como
essa xícara – tornou o mestre – você
está cheio de suas opiniões e especulações.
Como poderei mostrar-lhe o Zen, a menos que você esvazie
antes sua xícara?”
(O Zen nas Artes Marciais – Joe Hyams – Editora Pensamento)
Agora
estamos prontos para falar sobre treinamento de tiro esportivo.
Silvio
Aguiar
silvio.aguiar@gmail.com