Ser
Treinador é prestar serviços ao cliente Atleta
Fazendo
uma reavaliação da atividade de técnico,
repasso aos leitores um texto bastante oportuno, extraído
do livro “O Tiro com a Carabina” escrito pelo atirador
alemão Bernd Klingner, onde na página 197 ele define
o que é ser um treinador. Segue abaixo sua transcrição
conforme publicado na edição em português:
“O
Treinador
Os
impulsos necessários à vitória devem partir
do treinador. A ele compete preparar seus “pupilos”
para a competição, motivando-os para a vitória
e programando sua atuação.
Para isso, é necessária uma boa dose de conhecimentos
humanos, boas qualidades de liderança e muitos conhecimentos
do assunto. Fazem-se grandes exigências ao seu desempenho,
mas, infelizmente, existem ainda poucos treinadores capazes de
atendê-los. Seguem alguns pré-requisitos básicos
para um bom treinador:
1
– ser objetivo e tratar todos os atiradores da mesma forma
é o mandamento principal. No momento em que perdeu a confiança
de um atirador, ele perdeu a possibilidade de boa cooperação;
2 – desenvolver um plano de treinamento individual para
cada atirador, cuidando para que o mesmo seja cumprido;
3 - discutir problemas técnicos do tiro para indicar ao
atirador os seus erros. Mas deverá limitar-se a impulsos
do pensamento, fazendo com que o atirador pense por si e colabore.
Ao dar apenas indicações para se fazer determinadas
coisas, ele apenas provoca a resistência do atirador. Quando
pelo contrário, esse descobre o erro por si, terá
maior facilidade de saná-lo;
4 – planejar o treinamento de modo a torná-lo interessante,
conseguindo total colaboração dos atiradores;
5 – estimular os atiradores durante o treino-competição
e controle do desempenho de modo a agirem como se fosse competição;
6 - esclarecer os atiradores já durante o treino sobre
o desenrolar e a problemática da competição
em vista;
7 – manter as determinações para as eliminatórias
mesmo quando se torna difícil, quando um atirador pré-escalado
não consegue classificar-se;
8 – não deixar perceber o próprio nervosismo
ao participante antes da competição;
9 – estar presente só para seus atiradores, ignorando
seus próprios interesses;
10 – escalar os atiradores segundo seus pontos obtidos e
não pelo “sentido”, já que os pontos
são mais realistas;
11 – estar sempre ao alcance dos atiradores durante a competição,
caso aconteça alguma coisa de anormal;
12 – exigir do atirador apenas que atire da melhor forma
possível, mantendo afastados todos os demais problemas;
13 – dar valor às performances de cada um dos seus
atiradores;
14 – depois da competição, procurar uma razão
objetiva para cada resultado, bom ou mal, em conjunto com os seus
atiradores;
15 – lembrar de vez em quando que pode haver atiradores
sem treinador, mas não haveria treinador sem os atiradores;
Essa
lista poderia ser ampliada. Para finalizar, só mais o seguinte:
o treinador não deve retirar a responsabilidade do atirador
pelo seu desempenho. “O atirador tem que responsabilizar-se
por suas próprias ações.”
Para
mim, o texto é muito mais do que uma lista de pré-requisitos
para o cargo; eu a classifico como a “Tábua dos 15
Mandamentos do Técnico de Tiro Esportivo”.
Também
é muito importante entender, que apesar da conotação
“espiritual” do título que dei à lista,
no que tange ao resultado do treinamento, não existe “milagre”
e como bem preconiza Klingner, sem a conivência responsável
e conseqüente do atleta, pouco adiantará o trabalho
e a dedicação do técnico.
Para
os que não conhecem o autor, Bernd Klingner foi atirador
de carabina da equipe alemã nas décadas de 60 e
70. Competindo nas três modalidades olímpicas, conquistou
vários títulos europeus, mundiais e olímpicos,
destacando a medalha de ouro nos Jogos Olímpicos do México
(1968) na prova de carabina 3x40 com 1157 pontos.
Seus
melhores resultados em provas internacionais foram: 3x40 –
1177; deitado 60 tiros - 600; deitado 40 tiros – 400; pé
40 tiros - 387; joelho 40 tiros – 398; carabina standard
– 586; carabina de ar 40 tiros – 392.
A
citação acima tem como objetivo ressaltar o que
é dito e reclamado por muitos atiradores: que não
há como ser um Campeão (propositadamente com “C”
maiúsculo) sem um técnico. Ao que eu acrescento:
e sem a obediência a um programa de treinamento.
Aliás,
não é só no esporte que a coisa funciona
dessa forma. Segundo a definição de Timothy Gallwey,
americano, consultor e coach empresarial, a atividade de coaching
“é uma relação de parceria que revela/liberta
o potencial das pessoas de forma a maximizar o desempenho delas.
É ajudá-las a aprender, ao invés de ensinar
algo a elas”.
No
livro “Coach, um parceiro para o seu sucesso”, da
Editora Gente, a autora brasileira, consultora e coach empresarial
Ane Araújo, descreve: “É o coach que dá
suporte ao cliente, serve ao cliente, a não o contrário.
Mesmo que seja um líder apoiando pessoas do seu time, ele
está a serviço do time, e não o inverso”.
Mais adiante ela define: “Coach é o papel que você
assume quando se compromete a apoiar alguém a atingir determinado
resultado. Portanto, o processo de coaching começa quando
a pessoa procura o seu apoio para resolver um problema ou realizar
um projeto, e você aceita comprometer-se com esse papel”,
complementa Ane Araújo.
Dessa
forma, fazendo o paralelo com o mundo empresarial, o atleta é
o cliente e o treinador ou coach é o seu facilitador no
processo de desenvolvimento de novas competências, assegurando-se
que o cliente produza os resultados desejados.
Quando optei por atuar como “coach de tiro esportivo”,
passei a observar o comportamento dos profissionais de sucesso
nessa área, e adotei como exemplo um dos melhores da atualidade,
o técnico “Bernardinho”.
Numa
recente reportagem sobre o seu sucesso à frente da nossa
seleção de vôlei, ficou patente pela incrível
coincidência da sua forma de agir e pensar com os “15
Mandamentos” acima, que a minha escolha foi acertada tanto
nos “mandamentos” quanto no modelo. Dentre outras
“verdades,” ele afirma que “só é
campeão aquele que gosta de treinar”.
Aliás,
a reportagem atualizou o meu conceito quanto à proporção
inspiração / transpiração na fórmula
do sucesso. Antes eu achava ser de 10% - 90%. Na entrevista ele
define a composição como sendo 1% de inspiração
e 99% de transpiração.
Resumindo:
tanto no mundo do esporte como no empresarial, o treinador ou
coach é um prestador de serviços ao cliente, porém
da mesma forma, o bom cliente é aquele que é fiel
e responsável. No caso do cliente atleta, a fidelidade
reside na dedicação aos treinamentos.
Silvio
Aguiar
silvio.aguiar@gmail.com