Rumo
ao Centro
Antes
que eu esqueça: qualquer dúvida, crítica
ou sugestão envie um e-mail para silvio.aguiar@gmail.com
. O “feed back” de vocês é muito importante
para mim.
Durante
os próximos artigos vou tentar passar para vocês
o que, no momento, entendo ser o melhor caminho para se chegar
ao centro e nele permanecer.
Não
serão artigos puramente técnicos, pois o caminho
é composto muito mais de atitudes do que de conhecimentos
técnicos. Na realidade, a técnica do disparo é
muito simples; o difícil é regular e controlar a
máquina responsável pela sua execução:
o cérebro.
A
técnica, como falei, é simples; consiste em assumir
uma posição estável, alinhar a arma na direção
do alvo, acionando o mecanismo de disparo sem alterar a estabilidade
e o alinhamento, possibilitando assim, que o projétil lançado
atinja o centro do alvo. Simples, muito simples!
Para
que possamos falar a mesma linguagem, selecionei duas frases que
sintetizam o que entendo por “filosofia de treinamento do
tiro esportivo”.
A
primeira, do Psicólogo Roberto Shinyashiki, profundo conhecedor
da alma humana. Ela define os principais atributos que o vencedor
necessita:
“Ninguém
chega ao sucesso por acaso, por trás de um troféu
sempre existe uma trajetória calcada em muita disciplina
e perseverança.”
A
segunda, de Mario Quintana, exprime com a sensibilidade dos poetas,
a minha maneira de ver não só o esporte, mas a vida
em si:
“O
segredo não é correr atrás das borboletas...É
cuidar do jardim para que elas venham até você.”
Portanto,
para regular a nossa máquina de produção
de centros e mantê-la funcionando corretamente, necessitaremos
de muita disciplina, perseverança e principalmente, de
compreender que o dez é uma conseqüência, e
não o objetivo. O dez é a nossa borboleta.
O
que será então o nosso jardim? Qual é a responsabilidade
do atleta do tiro esportivo?
Todo
esporte individual calcado na execução de uma ação
que é aferida por um parâmetro mensurável,
tem o mesmo perfil do tiro esportivo. Executa-se a ação,
e através da medida desse parâmetro avalia-se quão
melhor foi a sua execução. Um atleta de salto em
altura, ao ultrapassar o sarrafo, tem na altura do mesmo a avaliação
do resultado de sua ação. Um corredor de 100 metros
avalia o seu desempenho pelo tempo medido para percorrer a distância.
Porém no tiro, mais especificamente nas modalidades de
bala, encontramos uma característica ímpar: durante
a prova não temos informação nenhuma do resultado
dos outros atiradores. Por isso, não competimos contra
ninguém. A aferição e comparação
dos desempenhos só são feitas após o término
da competição. Mantemos a nossa competitividade
sem nenhuma informação sobre o desempenho dos demais
participantes. Assim, mais do que em qualquer outro esporte, no
tiro vence quem melhor controlar e regular a sua psique.
Em
termos de resultado, a ação correta é aferida
pela posição dos impactos em relação
ao centro geométrico do alvo. Quanto mais próximo
do centro, mais corretamente a ação foi executada,
certo? Em parte. Nem sempre o tiro no centro do alvo indica que
o processo foi executado corretamente.
Apesar
de o resultado ser determinado pela soma dos pontos, para efeito
de regulagem e treinamento da nossa “máquina de fazer
tiros certos”, o que vale em primeiro lugar é o agrupamento
dos impactos. Ou seja, quão junto estão os tiros
efetuados. O valor do tiro em si só passa a ter importância
muito adiante, quando já aprendemos a forma correta de
executar o processo do disparo; no ajuste fino da máquina.
Por
isso, a primeira distinção que faremos é
sobre a responsabilidade do atirador. De todos os fatores que
influenciam no seu resultado, muitos não dependem especificamente
dele e, por conseguinte, não são de sua responsabilidade
direta. Aí se incluem os equipamentos utilizados, a munição,
as instalações e os fatores climáticos como
vento, temperatura, luminosidade, etc...
Logicamente,
a escolha do material mais apropriado e o cuidado para que funcione
da melhor forma possível é da responsabilidade do
atirador, porém, a sua dedicação ao treinamento
não fará, por exemplo, que a munição
escolhida e testada, produza um agrupamento menor do que o obtido
com a sua arma na estativa.
As
instalações e os fatores climáticos afetam
igualmente a todos os concorrentes, porém é da responsabilidade
do atleta a análise prévia dos mesmos, traçando
a tática que adotará durante a competição.
Lembro-me
de uma competição de carabina deitado, uma prova
internacional, que um atleta da Seleção Brasileira
levou 45 minutos, depois que o juiz deu o aviso de prova iniciada,
para escolher o “insert” que deveria utilizar para
a luminosidade do dia. Essa certamente foi a tática escolhida
para justificar o seu péssimo resultado, e não para
garantir o seu melhor desempenho.
Essa
definição de responsabilidade é fundamental
para que o atirador perceba e se conscientize onde ele deve concentrar
os seus esforços de treinamento, ou seja, no que ele realmente
pode influenciar e desenvolver.
O
certo é que antes de comprar qualquer equipamento, ele
leia os regulamentos técnicos da modalidade que escolheu.
Sua responsabilidade começa então, no conhecimento
das regras da prova, para então definir o que adquirir.
Nessa fase de testes é importante que o clube tenha material
para emprestar ao atirador iniciante, e que esse atirador seja
orientado no sentido de fazer investimento correto no material.
Após
comprar o melhor equipamento que a sua “habilidade financeira”
permite, o próximo passo é conhecer todos os recursos
que ele oferece, incluindo as possibilidades de regulagem e os
seus efeitos.
O
passo seguinte é ajustar o conjunto arma/atirador. Inclui-se
no item atirador; a roupa de tiro e os demais apetrechos utilizados
por ele, como óculos, abafador de ruído, etc...
E no item arma; a bandoleira, o gancho, as miras, a empunhadura
ou coronha, etc...
Revendo
a definição da técnica do tiro esportivo,
na sua simplicidade ela exige que de forma natural, sem esforço,
o atirador consiga alinhar e estabilizar a sua arma na direção
do alvo. Para isso, ele tem que ser capaz de em frente a uma parede
branca e com os olhos fechados, levar a arma até a posição
de disparo, e ao abrir os olhos, encontrar a figura alça/massa
alinhada. Essa é a informação de que o conjunto
arma/atirador está pronto e ajustado.
O
nosso jardim, portanto, começa no conjunto arma/atirador.
O primeiro passo para cuidar dele é acertar o alinhamento
desse conjunto.
Eu
levei cerca de um ano para ajustar o meu conjunto na pistola livre
e na pistola de ar; trabalhando com paciência os cabos para
que, ao empunhar a arma e levantá-la de olhos fechados
até a altura de disparo, pudesse ao abri-lo, encontrar
as miras alinhadas. Esse é um trabalho que deve ser feito
pelo atirador. Quando muito, orientado pelo técnico. Mas
quem tem que pegar na massa e na lixa, é você.
Cabe
ressaltar, que a arma deve vir ao atirador, e não o inverso.
Principalmente, a cabeça deve permanecer numa posição
natural, possível de ser assumida sempre igual, sem esforços
e, desse modo, repetida milhares de vezes.
Uma
vez ajustado a empunhadura e o alinhamento, por favor, não
mexa, por um longo tempo, na arma. É muito comum atiradores
passarem a vida toda “encontrando” no cabo ou na coronha
um novo jeito de fazer o dez. Não tem “novo jeito”.
Se o conjunto está alinhado, sem esforço, com a
cabeça na posição natural, esse passo está
dado e é praticamente definitivo.
Se
não ficou igual ao “Centrovizk” ou ao “Xang
Ten”, os dois melhores atiradores do momento, não
se preocupem: vinte, dos vinte primeiros atiradores do ranking
mundial da sua prova têm conjuntos atirador/arma diferentes
entre si. A única coisa que eles todos têm em comum
é o correto alinhamento das miras, sem esforço.
Não
estamos falando ainda de posição, apenas do alinhamento
básico, primário, que permitirá iniciarmos
o trabalho de desenvolvimento dos elementos (fundamentos) do processo
de disparo.
Ao
terminar de ler esse artigo, faça o “teste do alinhamento”.
Mas seja honesto. Nada de jeitinhos. Em frente a uma parede branca,
feche os olhos e leve a sua arma até a altura de disparo.
Quando ela estiver estabilizada na posição de disparo,
abra os olhos e verifique se as miras estão alinhadas corretamente.
Se você teve que movimentar sua cabeça, o pulso ou
reajustar a arma ao corpo para tê-las alinhadas, em suma,
deu um jeitinho, volte à etapa zero. Qualquer ação
ou disparo feito com o conjunto arma/atirador não alinhado,
já começa errado.
Parece
óbvio, mas vocês não imaginam a quantidade
de “bons” atiradores que chegam à Seleção
Nacional sem terem esse conjunto corretamente ajustado. Depois,
não sabem por que as borboletas não pousam no seu
jardim...
Silvio
Aguiar
silvio.aguiar@gmail.com