Empunhadura
- física e técnica – o segundo fundamento
A
importância da correta empunhadura física, ou seja,
o cabo da sua arma corretamente ajustado à sua mão,
já foi enfatizado em artigos anteriores, mas cabe lembrar
o ponto principal: proporcionar de forma natural o alinhamento
da figura alça e massa, tanto em altura como na horizontal,
com a arma na posição de disparo.
Lembro-me
de um Grande Prêmio Brasil, no estande da Vila Militar,
que o atirador alemão de tiro rápido disparou mais
de 500 tiros no treino, dois dias antes da competição,
para literalmente refazer o seu cabo envolvente (permitido na
época). Ao chegar ao Brasil, devido às condições
climáticas, sua mão não entrava no cabo.
Felizmente, já havia uma massa de secagem rápida
(plastic wood) que lhe permitiu moldar um novo cabo. Hoje, apenas
na Pistola Livre é permitido o uso de cabo envolvente,
desde que não cubra o pulso, impedindo o movimento vertical
do mesmo.
Assim,
não só o atirador tem que saber como ajustar o seu
cabo, como só a ele cabe essa importante tarefa. No máximo,
você pode partir de um cabo feito por terceiros, porém
o ajuste fino da empunhadura, só você é capaz
de fazê-lo com exatidão.
Atualmente,
os cabos permitem diversos ajustes que possibilitam chegar ao
alinhamento natural com certa facilidade. Porém, um pouco
de “plastic wood” e umas lixadas sempre serão
necessárias.
Se
o cabo já cumpre com a tarefa de alinhar naturalmente o
jogo de miras, o que mais importa no hábito de empunhar?
Que influência o ato de segurar a arma tem no desempenho
do atleta? Chegamos então à empunhadura técnica,
ou melhor, na técnica de empunhar a arma.
Para
montar o modelo mental do hábito correto do fundamento
“empunhadura”, vamos recorrer a alguns conceitos de
balística interna e da física.
No
momento que pressionamos o gatilho e liberamos o percussor, esse
ao atingir a cápsula (ou espoleta) deflagra a queima da
pólvora, iniciando o movimento do projétil pelo
cano da arma. O projétil, ao ser empurrado para frente
pela pressão interna do cano, engasta nas raias e, ao mesmo
tempo em que desliza pelo cano, ganha um movimento de rotação
provocado pelo projeto das raias.
No
momento em que se inicia o movimento do projétil dentro
do cano, para que ele seja impulsionado para frente, uma força
de igual intensidade e direção contrária
(ação e reação) empurra a arma para
trás, causando o que chamamos de “recuo” ou
“coice”. Essa força tem sua intensidade determinada
pelo tipo de munição que utilizamos, e tem como
eixo de aplicação o eixo do cano.
Como
estamos “empunhando” a arma, nossa mão recebe
a ação direta desta força e para evitar que
a arma venha para trás, produz uma força de reação
ao recuo, só que num eixo paralelo e abaixo do cano. Forças
iguais e contrárias, atuando em eixos paralelos geram um
binário; nesse caso, dois: um atuando no plano vertical
e outro no plano horizontal.
Esses
binários são responsáveis pelos ângulos
de salto nos respectivos planos, que fazem com que o cano se desloque
para cima e para o lado esquerdo ou direito, dependendo da mão
que utilizamos para empunhar a arma.
Voltando
ao projétil, observamos que os ângulos de salto ocorrem
durante o curto período (“delta t”) que ele
percorre o cano, fazendo com que no momento em que ele (o projétil)
deixa a boca do cano, tenha o ponto inicial da sua trajetória
determinado pela amplitude dos dois ângulos de salto.
Já que o “recuo” é inevitável,
para que tenhamos um bom agrupamento dos impactos no alvo é
necessário que para todos os disparos os ângulos
de salto sejam os mais uniformes possíveis. Isso requer
(como tudo no processo do disparo) conformidade. No caso da empunhadura,
conformidade é conseguida por duas ações:
empunhar, durante todo o processo do disparo, com a mão
sempre no mesmo lugar e empunhar sempre com a mesma força.
Se
o nosso cabo está “pronto”, permitindo sem
esforço o alinhamento da figura alça/massa, a conformidade
de posicionamento da mão para todos os disparos está
praticamente garantida. Mesmo nas pistolas (semi-automáticas
e revólveres) de punho não anatômico, é
fácil encontrar uma referência tátil (sinestésica)
que permita reproduzir a mesma empunhadura para todos os disparos.
Empunhar
sempre com a mesma força traz como conseqüência
direta uma pergunta: com que força deve empunhar? A resposta
converge para a premissa máxima do nosso esporte: comodidade.
Qualquer força entre a arma cair da sua mão (força
mínima) ou a arma começar a tremer (força
máxima), responde corretamente a pergunta; desde que essa
força não lhe provoque uma incômoda sensação
de que estou apertando pouco ou muito o cabo da arma.
O
melhor caminho é deixar que o seu cérebro “encontre”,
de forma inconsciente, a força ideal. Ele faz isso facilmente;
basta você solicitá-lo e não mais atrapalhá-lo
com a sua “arrogância consciente”. Tentar encontrar
a “força ideal de empunhadura” é o mesmo
que tentar racionalizar com que força deve segurar a caneta
na hora de escrever.
Mestre
Silvino, na sua sabedoria, recomendava: segure a arma como se
fosse um passarinho; se soltar ele voa, se apertar ele morre.
O
que realmente importa não é com que força
você empunha, mas sim que o faça sempre com a mesma
intensidade e que a mantenha igual durante todo o processo do
disparo. Dessa forma, os ângulos de salto ou o “recuo”
serão os mesmos para todos os disparos, provocando o mesmo
“desvio” no ponto inicial da trajetória dos
projéteis. Trazer o centro do agrupamento para o centro
do alvo é feito pela “poderosa” chave de “click”.
Nessa
altura, você que é inteligente, já percebeu
que o fundamento “empunhadura” se aprende e treina
junto com o fundamento “posição interior”,
uma vez que ao exercitá-la desenvolvemos e fixamos a “memória
muscular” responsável pelo controle da estabilidade
e imobilidade do conjunto atirador/arma, do qual empunhar é
parte integrante.
Então,
o exercício de “posição interior”
(artigo anterior) ganha uma maior amplitude na medida em que introduzimos
no seu modelo mental a atitude de empunhar com força constante
e sempre igual, desenvolvendo a percepção sinestésica
da pressão e do contato da mão com a arma.
Ao
treinar “posição interior” estamos “ensinando”
nosso cérebro como queremos que ele mantenha, de forma
pró ativa, a estabilidade e o tônus muscular do corpo
como um todo, incluindo o hábito correto de empunhar.
Uma
vez aprendida, é só treinar, treinar, treinar......
Já
ia me esquecendo: o alemão, aquele que refez o cabo da
pistola, ganhou no dia seguinte a prova de Tiro Rápido
do Grande Prêmio Brasil.
Use
sua inteligência para transportar para sua modalidade os
conceitos da correta empunhadura, seja ela carabina, prato, etc...
Silvio
Aguiar
silvio.aguiar@gmail.com