Exercícios
e Programas de Treinamento
Seja
você um atirador veterano ou um iniciante, é imperativo
que entenda a necessidade de treinar com base em um programa de
exercícios que possibilite a melhora contínua e
progressiva de cada fundamento. Esse é o único caminho
para a evolução técnica.
Digo
isso porque é muito comum ainda vermos atletas, iniciantes
e veteranos, indo ao clube apenas para atirar sem nenhum programa
elaborado de exercícios. Apenas disparam contra o alvo
com o único objetivo de marcar pontos.
Nos
artigos anteriores, falei um pouco sobre cada fundamento, cada
elo da corrente que compõe o processo do disparo. Nos próximos,
vou tentar ajudá-los na elaboração de exercícios
de treinamento e na busca da melhor forma de montar o seu programa
de treinamento.
Serão
artigos mais técnicos e voltados a ajudar tanto os treinadores
quanto os atletas que praticam sozinhos. Por isso, muitas dúvidas
irão surgir, e, espero que muitas sugestões também.
O intuito é fomentar o debate e a participação
do todos através de e-mail ou de comentários.
Vamos
iniciar com os exercícios e, ao longo dos próximos
meses falaremos dos programas de treinamento.
É
importante lembrar que nossa filosofia de aprendizado tem com
base a elaboração do modelo mental do fundamento
treinado, para que durante o exercício o atleta possa tirar
maior proveito do mesmo, realimentando constantemente esse modelo,
com informações obtidas pelas observações
do técnico, de auto-análise do atleta (sensações
e percepções) e de recursos pedagógicos como
os sistemas eletrônicos de apoio ao treinamento (Rica, SCATT,
etc..) e câmeras de vídeo.
Nada
disso é novidade. Em 1977, quando fiz um estágio
na escola de tiro alemã em Wiesbaden, pelo menos duas vezes
na semana treinávamos com o apoio da gravação
em vídeo (VHS) para posterior visualização
e análise do gestual no monitor de TV, juntamente com o
técnico. Assistir o seu movimento é um poderoso
recurso pedagógico para a formação correta
dos hábitos motores e do gestual pretendidos.
Para
começar, vamos estabelecer a seguinte metodologia: primeiro
definir local e material necessário à realização
do exercício, em seguida, relembrar as premissas determinantes
para construção do modelo mental do fundamento,
ação motora ou gestual, clarificar a meta a ser
atingida levando-se em conta o fundamento e o exercício
proposto; por último apresentamos o exercício e
as considerações pertinentes à sua execução.
Exercícios
para Posição
Logicamente, os primeiros exercícios que abordaremos serão
para o fundamento posição, subdivididos em posição
exterior e interior.
Posição Exterior
Simples, porém fundamental para o atleta posicionar-se
corretamente em relação ao alvo.
Local
e Material
Pode ser feito no estande (posto de tiro) ou em casa. Cabe relembrar
que para realizá-lo em casa necessitamos de um circulo,
representativo da zona de visada, impresso em uma folha branca
de papel, posicionado na altura calculada pela proporção
entre a altura da zona de visada a 10 metros e à distância
que o atirador se posiciona desse círculo representativo.
Essa distância não deve ser superior a 2 metros.
Quanto mais perto da parede melhor.
Premissas
Entende-se por uma correta posição exterior, aquela
que permite o posicionamento e a natural manutenção
do conjunto arma/atirador, alinhado com a linha vertical que passa
pelo centro da zona de visada, sem que para mantê-lo durante
todo o processo de disparo, o atleta tenha que deslocar o tronco
(ou braço) para direita ou esquerda, forçando a
manutenção desse alinhamento (figura de visada na
zona de visada).
Meta
Zerar o conjunto atirador/arma em relação ao alvo,
tendo como principal preocupação o alinhamento horizontal
da figura de visada (alça/massa) em relação
à zona de visada. O nosso objetivo é evitar assumir
um posicionamento horizontal forçado do braço, que
teria como conseqüência uma variação
lateral dos impactos pela tendência do corpo se manter e
retornar ao ponto natural de equilíbrio. Isto é,
o braço sempre tende a correr para a posição
natural de equilíbrio e nosso objetivo é coincidir
esse ponto de equilíbrio com a zona de visada.
Exercício
Assumir a posição em relação ao alvo,
olhando fixamente para a zona de visada. Repassar mentalmente
a lista de verificação: POSIÇÃO (relaxar
os grupos musculares desnecessários e ativar o tônus
muscular dos necessários à sustentação
da arma e do controle da posição), EMPUNHADURA (perceber
o contato homogêneo da mão no cabo da arma) e posicionamento
do DEDO NO GATILHO (perceber o contato do dedo na posição
certa). Fechar os olhos, levantar a arma com o mesmo movimento
utilizado para o disparo, passando do centro do alvo e descendo
até a altura de disparo. Abrir os olhos e verificar a posição
da figura de visada.
Caso
a figura não esteja horizontalmente alinhada no plano vertical
que passa pelo centro do alvo, acerte o corpo girando no seu eixo
vertical ou deslocando o corpo para esquerda ou para a direita.
Veja que, nesse momento, a altura não é tão
importante.
Repetir
dez vezes o exercício, mesmo que já tenha zerado
a sua posição. Recomendo marcar a posição
dos pés no chão, tanto para assumi-la posteriormente,
como para gravá-la visualmente em relação
ao centro do posto de tiro. Ao terminar o treino, apague as suas
pegadas. É importante treinar sempre em postos diferentes,
modificando assim as condições de treino.
Posição
Interior
Responsável por 50% do Tiro Certo, o treino desse fundamento
deve ser a ênfase do programa (90%) no primeiro ano do atleta
iniciante, bem como 80 a 60% do treino técnico dos demais
atletas no primeiro mesociclo (1º bimestre) do macrociclo
anual. Irá requerer um condicionamento geral mínimo
e será à base do condicionamento físico especial.
Local
e Material
Idem.
Premissas
Entende-se por uma correta posição interior, aquela
que permite o posicionamento natural da figura de visada dentro
da zona de visada, durante todo o processo de disparo, a manutenção
da estabilidade e imobilidade da posição, a firmeza
do punho e a pressão constante dos músculos da mão
conta o cabo da arma, incluindo o toque do dedo contra a tecla
do gatilho. Tudo isso, com o máximo de economia de energia
e o maior conforto possível, permitindo assim assumirmos
naturalmente a nossa posição, milhares de vezes,
de forma sempre igual.
Meta
Transformar o atleta em uma estátua (estativa), firme e
posicionado corretamente em relação à zona
de visada durante todo o processo de disparo e igual para todos
os disparos.
Com esse exercício, buscamos desenvolver a percepção
cinestésica e a pró-atividade no controle da estabilidade
e da imobilidade, através do incremento da comunicação
entre o cérebro e os sensores que informam as alterações
de movimento e sentido de posição do corpo (proprioceptores),
criando assim a memória muscular da posição
e da pressão de empunhadura (que músculos usar e
com que tônus), bem como a percepção tátil
da mão com o cabo e do dedo indicador com o gatilho. Veja
que incluímos o toque do dedo no gatilho como parte integrante
da empunhadura e esse conjunto, para efeito de treinamento, como
parte integrante da posição interior.
Exercício
Assumir a posição marcada no exercício anterior.
Olhando fixamente para a zona de visada (acerto da posição
da cabeça), repassar mentalmente a lista de verificação:
POSIÇÃO (relaxar os grupos musculares desnecessários
e ativar o tônus muscular dos necessários à
sustentação da arma e do controle da posição),
EMPUNHADURA (perceber o contato homogêneo da mão
no cabo da arma) e posicionamento do DEDO NO GATILHO (perceber
o contato do dedo na posição certa).
Levantar a arma de olhos abertos, executando o mesmo movimento
utilizado para o disparo. É importante alinhar a figura
de visada acima do alvo, firmando o tônus muscular do punho
para só então baixar a figura até a zona
de visada num movimento vertical uniforme que permita entrar na
zona de visada com a figura alça/massa corretamente alinhada.
Aguardar o início da estabilização do braço
e fechar os olhos.
Passar toda a atenção para o grupo muscular e região
do corpo que se pretende treinar.
Abrir os olhos (após o tempo determinado pelo seu estágio
de treinamento) e verificar a posição da figura
de visada.
Se você se manteve imóvel, ela deverá estar
dentro da zona de visada.
O tempo de permanência com os olhos fechados irá
depender do condicionamento físico do atleta e deve ser
definido pelo técnico junto com o preparador físico.
Ele deve variar entre 15 e 40 segundos.
Faça
dez exercícios para cada região do corpo, dividindo-o
em três regiões, na seguinte seqüência:
inicie com dez exercícios focando sua atenção
nos sensores de pressão da sola do pé e pelos flexores
do pé, já que esses são, respectivamente,
os primeiros a perceber as alterações de estabilidade
do corpo e os responsáveis por controlá-la. Em seguida,
faça mais dez, com a atenção nos músculos
do tornozelo, perna, coxa e quadril, preocupado em determinar
o tônus muscular ótimo para manter o corpo imóvel.
Termine com dez exercícios focando as regiões do
ombro, braço, antebraço, punho, mão e toque
do dedo indicador, preocupado em manter o braço na horizontal,
o punho firme e trancado, a pressão firme, uniforme e cômoda
de empunhadura e o toque correto do dedo na tecla do gatilho.
É
comum, durante os exercícios, haver alteração
na posição exterior pela acomodação
do corpo do atleta ao esforço e pela alteração
dos grupos musculares utilizados na manutenção da
posição fruto da busca do tônus adequado.
Reposicione o corpo, como no exercício de posição
exterior.
Cabe
ressaltar que ao fecharmos os olhos, estamos eliminando propositadamente
a visão como modalidade sensorial, permitindo assim melhorar
a percepção cinestésica, valorizando a concentração
nas informações proprioceptivas, fundamentais na
formação da sensação muscular e cinestésica
da posição.
O
termo propriocepção é usado para indicar
o sentido de posição e movimento do corpo, e de
partes do corpo, assim como as forças e as pressões
no corpo ou em suas partes (Aprendizagem Motora, pg. 55 - Magill,
1987). Proprioceptores são sensores localizados em todo
o corpo que informam ao cérebro essas variações.
A
base da posição interior é, portanto, o controle
pró-ativo da estabilidade e da imobilidade, desenvolvido
pelo incremento da percepção proprioceptiva seletiva,
responsável pelo desenvolvimento do sentimento muscular
do gestual de cada modalidade do tiro esportivo.